quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Terceira via, grupo de índios defende permanência de brancos na Raposa/Serra do Sol por apoio tecnológico

Carolina Juliano
Enviada Especial do UOL
Em Boa Vista (RR)
Existe um terceiro lado da mesma moeda na discussão que envolve a demarcação contínua de 1,7 milhão de hectares no norte do Estado de Roraima e demarca a área como Terra Indígena Raposa/Serra do Sol: índios que são contrários à saída da região dos bancos que ali já vivem há algum tempo, mas que também não apóiam os produtores de arroz que ocupam as terras de reserva e não compartilham com eles a tecnologia e o maquinário necessários para tirar a riqueza da terra.

Esses indígenas são representados pela Sodiu-RR (Sociedade de Defesa dos Índios Unidos de Roraima) que, segundo Silvestre Leocádio da Silva, assessor da entidade, fala pela voz de pelo menos 12 mil indígenas em todo o Estado de Roraima.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Líder indígena critica argumentos de procurador na defesa de demarcação contínua

Luana Lourenço
Da Agência Brasil

Defensor da permanência dos grandes produtores de arroz na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, o tuxaua (cacique) José Brazão criticou a argumentação do procurador-geral da Republica, Antonio Fernando Souza, em defesa da manutenção da demarcação contínua da área, feita hoje (27) durante julgamento de ação no Supremo Tribunal Federal (STF).

"A defesa do procurador não me convenceu, quando ele falou que o laudo antropológico [que determinou a demarcação contínua] é legítimo. Não é. Sem desrespeitar o procurador, posso dizer categoricamente que ele não tem conhecimento dos fatos. O laudo é cheio de vícios, tenho certeza de que o procurador não leu, não tem conhecimento dos fatos", afirmou.

Brazão acompanha o julgamento ao vivo em uma televisão com serviço pago de captação por satélite, instalada em uma pequena tenda montada no Distrito de Surumu, no interior da Raposa Serra do Sol. Ao lado, cerca de 700 índios ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR) - que defende a saída dos produtores de arroz - rezam orações católicas e apresentam danças indígenas típicas enquanto aguardam a decisão do tribunal, que deve ficar para amanhã (28).

Segundo Brazão, a Sociedade de Defesa dos Indígenas Unidos de Roraima (Sodiu-RR) e outras entidades contrárias ao CIR fizeram um "estudo aprofundado" que aponta a divisão em ilhas como demarcação ideal para os 1,7 milhão de hectares da Raposa.

"Defendemos a soberania e a convivência com todos os brasileiros. O pessoal do CIR não sabe o que diz, eles estão fazendo mal para eles mesmos preferindo o isolamento", acrescentou a presidente da Aliança de Integração de Desenvolvimento dos Povos Indígenas de Roraima, favorável à permanência dos rizicultores, Deise Maria Rodrigues.

O tuxaua Brazão disse que, caso o STF mantenha a demarcação contínua, os índios ligados à Sodiu e aos arrozeiros não vão resistir com violência ou partir para o enfrentamento com os indígenas representados pelo CIR.

"Não temos intenção de gerar conflito aqui e sim de aguardar pacificamente o resultado e acatar a decisão do STF. Eles [CIR] estão trazendo pessoas para gerar um conflito", apontou. Ontem (26), o presidente da Sodiu, Sílvio da Silva, negociava com arrozeiros um ônibus para transportar apoiadores da entidade de Boa Vista até o Distrito de Surumu.

Cento e cinqüenta homens da Polícia Federal e pelo menos 40 da Força Nacional de Segurança estão na área para conter possíveis episódios de violência entre os grupos.

* do UOL Notícias

STF começa a julgar demarcação da Raposa Serra do Sol

Carolina Brígido e Jailton de Carvalho - O Globo; Agência Brasil; CBN


BRASÍLIA E BOA VISTA - Dezenas de índios com o rosto pintado de urucum e vestindo adereços típicos de suas etnias quebraram na manhã desta quarta-feira o sisudo protocolo do Supremo Tribunal Federal (STF). Depois de enfrentarem fila no STF, eles assistem ao julgamento que definirá a extensão da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, que teve início às 9h30m. O relator da ação, ministro Carlos Ayres Britto, começou a sessão com um relato descritivo do histórico da controvérsia. (Infográfico: Entenda o conflito na reserva)


Nestas quarta e quinta-feira, se não houver pedido de vista, os ministros decidirão se será possível a permanência de menos de uma dezena de grandes produtores de arroz e 50 famílias de agricultores em parte da área onde vivem cerca de 19 mil índios das etnias Macuxi, Wapichana, Patamona, Ingaricó e Taurepang. Pouco mais de uma centena dos habitantes da reserva não são índios.

O julgamento do STF é sobre uma área, de 1,67 milhão de hectares, registrada em cartório como de propriedade da União. Em 1998, o governo Fernando Henrique Cardoso declarou o local como de posse permanente indígena. Em 2005, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou decreto homologando a demarcação das terras de forma contínua. Em abril deste ano, a PF começou a retirada de não-índios, mas o STF determinou a suspensão da operação, até que a demarcação fosse julgada pelo tribunal.

A revisão da lei foi pedida pelos senadores Mozarildo Cavalcanti (PTB ) e Augusto Botelho (PT ), os dois de Roraima. Eles querem a demarcação em ilhas, o que permitiria a permanência de não-índios, entre eles, arrozeiros, dentro da reserva.

O prefeito de Pacaraima (RR) e líder dos produtores de arroz da região da reserva indígena Paulo César Quartiero, também chegou cedo ao STF, e assiste ao julgamento no plenário da Corte.

Uma das moradoras da região, a indígena Joênia Batista de Carvalho Wapichna, advogada, deverá fazer sustentação oral na sessão desta quarta, em nome dos povos que habitam o local. Ela defenderá a demarcação contínua das terras.

Até o início da sessão, Joênia não sabia se seria autorizada a fazer a sustentação oral. Nervosa, experimentou algumas capas no STF, reservada aos advogados que atuam nas causas em plenário. Joênia compareceu à Corte de saia até os joelhos e sapato de salto. Mas não se esqueceu de pintar o rosto e se enfeitar com colares de sementes.

Ministros temem que modelo contínuo prejudique Roraima
Pelo menos cinco dos 11 ministros do STF estão preocupados com a demarcação contínua da reserva indígena, onde estão localizados dois municípios, outros povoados de não-índios, uma rodovia federal, plantações de arroz importantes para a economia do estado e um terreno destinado à construção de uma hidrelétrica. Três ministros manifestaram essa opinião ao 'Globo' em caráter reservado. Outros dois - o presidente, Gilmar Mendes, e Celso de Mello - declararam a preocupação com o tipo de demarcação da reserva em entrevistas concedidas em abril.

Clima de tranqüilidade na Praça dos Três Poderes
Um grupo de aproximadamente 60 pessoas, entre elas índios e sem-terra , está aglomerado na Praça do Três Poderes em frente ao STF para acompanhar a sessão. Segundo a Polícia Militar, o número de manifestantes está bem aquém das expectativas dos órgãos de segurança.

- Oitenta policiais militares foram mobilizados para fazer a segurança no local. O prédio do Supremo foi isolado da praça por grades. A previsão era que viria muito mais índios, muito mais gente, mas por enquanto só tem esses aí - afirmou o capitão José Antônio da Silva Dias, apontando para o pequeno grupo de índios e sem-terra.

O clima é de tranqüilidade. O índio Álvaro Tucano, de uma tribo Tuicano do rio Negro, disse que poderá haver resistência caso o STF anule o decreto de homologação de terras contínuas e determine a demarcação da reserva em ilhas como querem os produtores de arroz , comerciantes e políticos de Roraima.

- Nos 500 anos os povos indígenas sempre resistiram - disse o índio, informando que a forma de resistência, neste caso, será discutida depois da decisão do Supremo.

Na praça os manifestantes exibem faixas com frases em defesa da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol em terras contínuas.

- A demarcação em ilhas não existe. É apenas uma formação para atender os interesses econômicos. Os arrozeiros que estão lá são invasores, eles sabiam o tempo todo que as terras pertenciam aos índios. - afirmou Éden Magalhães, secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (CIMI).

Independentemente da decisão, índios dizem que não desocupam Raposa
Na terça-feira, representantes dos 18 mil índios que vivem na região avisaram que não deixarão de ocupar nenhuma área, mesmo que a mais alta corte do país autorize a permanência de arrozeiros e famílias de agricultores brancos. A Polícia Federal já recebeu reforço no contingente para monitorar a área nos próximos dias. Agentes da Força Nacional de Segurança também estão na região. ( Veja fotos do protesto dos índios )

- O STF pode tomar decisão de qualquer forma que seja, mas aquela terra ali nós vamos continuar ocupando - disse o coordenador-geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Dionito José de Souza. - Os povos indígenas não vão sair de lá, sendo (a demarcação) em área continua ou em ilhas. A gente não vai aceitar limite de arrozeiro ou alguém que queira limitar nossa terra ali.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Pantanal: Povos Indígenas

Os povos indígenas que tradicionalmente habitam o Pantanal são:

Paiaguás, Guaikuru, Guatós, Terenas, Kaiowás, Bororos, Umotinas, Parecis, Kinikinaos


Paiaguás

Povo indígena hoje extinto, habitavam o pantanal quando da chegada dos Portugueses e travaram, juntamente com os Guaikuru, intensas batalhas, das quais muitos portugueses não sobreviviam. Perseguidos e acuados, foram progressivamente sendo exterminados não restando qualquer registro da presença de seus descendentes atualmente.

Guaikuru

Aliados dos Paiaguás contra um inimigo comum, os exímios cavaleiros guaikurus ofereceram grande resistência à povoação do Pantanal matogrossense. Um tratado de paz em 1791 os declara súditos da Coroa Portuguesa.

Guatós

Povo de lingua do tronco Macro-Jê. Foi considerado extinto por 40 anos, até que, em 1977, foi reconhecido um grupo Guató na ilha Bela Vista do Norte. Vive no Pantanal Mato-Grossense e disperso ao longo dos rios do médio e alto Paraguai, São Lourenço e Capivara, no município de Corumbá (MS). Segundo a Funai, em 1989 eram 382 índios.

Terenas

Ou Tereno. Povo de língua da família Aruák. Parte dele (cerca de 12.000 indivíduos) vive no oeste de Mato Grosso do Sul, em oito áreas indígenas; outra parte (350 índios) ocupa terras nas áreas indígenas de Icatu, Araribá e Venuíre, no interior do Estado de São Paulo, juntamente com os Kaingang.

Kaiowás

Bororos

Povo falante de língua do tronco macro-jê. Os Bororo atuais são os Bororo Orientais, também chamados Coroados ou Porrudos e autodenominados Boe. Os Bororo Ocidentais, extintos no fim do século passado, viviam na margem leste do rio Paraguai, onde, no início do séc. XVII, os jesuítas espanhois fundaram várias aldeias de missões. Muito amigáveis, serviam de guia aos brancos, trabalhavam nas fazendas da região e eram aliados dos bandeirantes. Desapareceram como povo tanto pelas moléstias contraídas quanto pelos casmentos com não-índios. Os Bororo Orientais habitavam tradicionalmente vasto território que ia da Bolívia, a oeste, ao rio Araguaia, a leste e do rio das Mortes, ao norte, ao rio Taquari, ao sul. Ao contrário dos Bororo Ocidentais, eram citados nos relatórios dos presidentes da província de Cuiabá como nômades bravios e indomáveis, que dificultavam a colonização. Foram organizadas várias expedições de extermínio. Uma delas, a de Pascoal Moreira Cabral, em 1718 ou 1719, após ser derrotada pelos indígenas, descobriu ouro às margens do rio Coxipó. Estimados na época em 10 mil índios, os Bororo sofreram várias guerras e epidemias até sua pacificação, no fim do século XIX, quando foram reunidos nas colônias militares de Teresa Cristina e Isabel e estimados pelas autoridades em 5 mil pessoas. Nas colônias, a convivência com os soldados, a promiscuidade, o consumo de álcool e as doenças reduziram ainda mais a população. Entregues aos salesianos para catequese, em 1910, os Bororo somavam 2 mil índios. Em 1990, com uma população de aproximadamente 930 pessoas, vivem em cinco pequenas áreas indígenas (Merure, Teresa Cristina, Tadarimana, Perigara e Jarudore) que somam 133 mil hectares, nos municípios de Barra do Garça, Barão do Melgaço, General Carneiro, Poxoréu e Rondonópolis no Estado do Mato Grosso. Há também um grupo em Sangradouro, no mesmo estado. Este povo, que era caçador e coletor, vive hoje da agricultura e da venda de artesanato. Sua cultura, muito complexa, foi objeto de muitos estudos. As pessoas são separadas em várias categorias sociais, com papéis de oposição; durante o ritual funerário, que pode durar até dois meses, juntam-se em papéis complementares e fazem novas alianças, reforçando a coesão grupal.

Umotinas

Subgrupo Bororo de língua da família Otukê, do tronco Macro-Jê. Eram conhecidos como “barbados”, porque usavam barba, às vezes postiça - feita de pêlos de macaco bugio ou de cabelos das mulheres da tribo. Vivem na Área Indígena Umutina, no município de Barra dos Bugres no Mato grosso, juntamente com os Paresí, Kayabí e Ñambikwára.

Parecis

Ou Paresí. Denominação dada a vários povos indígenas que falavam dialetos da língua Paresí, da família Aruák. Viviam no planalto do Mato Grosso e eram uma das fontes de escravos preferidas dos bandeirantes; dóceis e pacíficos, trabalhavam na agricultura e fiavam algodão para a confecção de redes e tecidos. No início do século XX foram encontrados pela comissão do Marechal Rondon, ainda traumatizados pela violência dos contatos anteriores. Rondon os conduziu para terras protegidas por suas tropas e os Paresí se tornaram seus principais guias na região. Um desses povos, autodenominado Halíti, vive na região dos rios Juruena, Papagaio, Sacre, Verde, Formoso e Buriti, no oeste de Mato Grosso, em várias áreas indígenas, nos municípios de Tangará da Serra, Vila Bela da Santíssima Trindade e Diamantino. Em 1990, segundo a Funai, eram 900 índios.

Kinikinaos





Salatiel Alves de Araujo

e-mail : salatiel@nutecnet.com.br

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Questão indígena pode barrar investimentos em MS

O vice-presidente da Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de MS), Eduardo Riedel, no Café com Notícias, promovido pelo Painel Florestal, nesta quarta-feira, na Fiems (Federação das Indústrias), afirmou que as demarcações no conesul do Estado já barram os investimentos na região.

“Temos 15 usinas na região sul do Estado. A região representa 30% do PIB do Estado, com 700 mil habitantes”, apontou o vice-presidente. A entidade já estuda a perda real e a imediata com as possíveis demarcações de terra na área indígena.

Riedel afirmou ainda que a preocupação não é só do setor rural. Empresários de outros setores, como o da indústria, já planejam ações para conter o Termo de Ajustamento de Conduta e também as vistorias. “Na próxima segunda-feira, a Fiems deve reunir os deputados estaduais e nos chamou para participar do debate”, informou o vice-presidente.

Da FM PAM

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Estado contrariou direito do índio em MS, diz procurador

Em meio ao debate sobre o início das demarcações dos territórios indígenas no Mato Grosso do Sul, em dois pontos, índios, produtores e autoridades compartilham da mesma opinião: primeiro, de que a questão fundiária sul-mato-grossense é delicada; o segundo, de que o problema foi criado pelo Estado brasileiro.

"Houve uma atuação do Estado contrária aos direitos dos indígenas. O Estado foi usado para a confinação dos índios", afirmou o procurador da República de Dourados, Marco Antônio Delfino de Almeida, em entrevista à Agência Brasil, citando as políticas de colonização de Mato Grosso do Sul empregadas pelos governos federal e estadual, principalmente, durante a primeira metade do século 20.

De acordo com Almeida, o governo incentivou que produtores rurais ocupassem áreas, naquela época, habitadas por indígenas e cometeu "algo que se equivale a um genocídio dos habitantes nativos dessas regiões". "O Brasil promoveu fatos parecidos com o que ocorreram na Sérvia, Ruanda e Sudão – que estão sendo julgados em tribunais internacionais. Não foram extermínios, estupros, mas um deslocamento de uma população inteira", complementou o procurador.

Fernando da Silva Souza, índio da etnia Terena e presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena em MS, conta que o antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) – órgão extinto para dar lugar à Fundação Nacional do Índio (Funai) – tinha como finalidade integrar o índio à sociedade. Por isso, também facilitou a colonização de áreas que, hoje, são alvo de discussões fundiárias entre índios e produtores rurais.

"A SPI errou. Quis integrar o índio, mas o índio não se integrou", disse Souza, também em entrevista. "Eles demarcaram reservas de 3,5 mil hectares, com 650 habitantes em cada, para abrir espaço às propriedades. Hoje, essas terras têm até 12 mil índios."

"Os produtores compraram as propriedades de boa-fé. Temos os títulos das terras", afirmou o produtor rural, Erny da Silva Agostini, 28 anos, tesoureiro do Sindicato dos Produtores Rurais de Amambai, cidade a 346 quilômetros de Campo Grande. "Tem muita gente que chegou aqui e investiu tudo o que tinha. Agora, vamos ter que entregar tudo?"

Agostini ajuda na administração de três propriedades rurais de sua família. Segundo ele, as terras foram compradas ou herdadas pelos seus pais de parentes que receberam a posse dos territórios do governo do estado. "Não sou contra o índio. Sei que eles passam por uma situação difícil, mas esta situação foi criada pelo governo. O ônus tem que ser de toda a sociedade. Não acho justo só o proprietário daqui pagar por isso", disse, lembrando que as propriedades declaradas território indígena serão expropriadas, sem indenização.

Fonte: campograndenews

domingo, 3 de agosto de 2008

Estado contrariou direito dos índios em MS, afirma procurador

Vinicius Konchinski
Enviado Especial


Dourados (MS) - Em meio ao debate sobre o início das demarcações dos territórios indígenas no Mato Grosso do Sul, em dois pontos, índios, produtores e autoridades compartilham da mesma opinião: primeiro, de que a questão fundiária sul-mato-grossense é delicada; o segundo, de que o problema foi criado pelo Estado brasileiro.

“Houve uma atuação do Estado contrária aos direitos dos indígenas. O Estado foi usado para a confinação dos índios”, afirmou o procurador da República de Dourados, Marco Antônio Delfino de Almeida, em entrevista à Agência Brasil, citando as políticas de colonização do Mato Grosso do Sul empregadas pelo governo federal e estadual, principalmente, durante a primeira metade do século 20.

De acordo com Almeida, o governo incentivou que produtores rurais ocupassem áreas, naquela época, ocupadas por indígenas e cometeu “algo que se equivale a um genocídio dos habitantes nativos dessas regiões”. “O Brasil promoveu fatos parecidos com o que ocorreram na Sérvia, Ruanda e Sudão – que estão sendo julgados em tribunais internacionais. Não foram extermínios, estupros, mas um deslocamento de uma população inteira”, complementou o procurador.

Fernando da Silva Souza, índio da etnia Terena e presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena em MS, conta que o antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) – órgão extinto para dar lugar a Fundação Nacional do Índio (Funai) – tinha como finalidade integrar o índio à sociedade. Por isso, também facilitou a colonização de áreas que, hoje, são alvo de discussões fundiárias entre índios e produtores rurais.

"A SPI errou. Quis integrar o índio, mas o índio não se integrou”, disse Souza, também em entrevista. “Eles demarcaram reservas de 3,5 mil hectares, com 650 habitantes em cada, para abrir espaço às propriedades. Hoje, essas terras têm até 12 mil índios.”

“Os produtores compraram as propriedades de boa-fé. Temos os títulos das terras", afirmou o produtor rural, Erny da Silva Agostini, 28 anos, tesoureiro do Sindicato dos Produtores Rurais de Amambai, cidade a 346 quilômetros de Campo Grande. "Tem muita gente que chegou aqui e investiu tudo o que tinha. Agora, vamos ter que entregar tudo?"

Agostini ajuda na administração de três propriedades rurais de sua família. Segundo ele, as terras foram compradas ou herdadas pelos seus pais de parentes que receberam a posse dos territórios do governo do estado. “Não sou contra o índio. Sei que eles passam por uma situação difícil, mas esta situação foi criada pelo governo. O ônus tem que ser de toda a sociedade. Não acho justo só o proprietário daqui pagar por isso”, disse, lembrando que as propriedades declaradas território indígena serão expropriadas, sem indenização.

Índios celebram início de demarcação de reservas em MS

Sessenta lideranças Guarani-Kaiowá e mais de uma centena de membros da etnia indígena participaram ontem (1o) da Aty Guassu (Grande Reunião, na língua Guarani), que marcou o início dos trabalhos de demarcação de reservas na região sul do Mato Grosso do Sul.

No evento, realizado na aldeia do Sassoró, no município de Tacuru (422 km de Campo Grande), os índios receberam com danças e rituais as equipes de pesquisadores contratados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) que identificarão áreas de 26 cidades sul-mato-grossenses tradicionalmente ocupadas por indígenas.

Representantes das 38 aldeias e 18 acampamentos, cujos habitantes reivindicam a posse de territórios hoje ocupados por propriedades rurais, também tiraram suas dúvidas sobre os trabalhos de demarcação com a administradora-executiva da Funai de Dourados, Margarida Nicoletti, e com o procurador da República da região, Marco Antônio Delfino de Almeida, que estiveram no encontro.

“É a primeira vez que a gente consegue amarrar uma conversa sobre o TAC [Termo de Ajustamento de Conduta, firmado entre Procuradoria da República e Funai prevendo a demarcação]”, disse Anastácio Peralta, membro da Comissão Nacional de Política Indigenista e Direito Indígena, em entrevista à Agência Brasil. “O Aty Guassu também serviu para darmos as boas-vindas para o pessoal que vem fazer a identificação.”

Getúlio Juca de Oliveira, líder da comunidade Guarani-Kaiowá de Dourados, destacou a importância da resolução da questão fundiária dos indígenas do MS para sua etnia. Segundo ele, a falta de terra tem causado sofrimento aos cerca de 40 mil Kaiowás e também o empobrecimento da sua cultura.

“Antes da colonização, os índios viviam espalhados. Cada família ficava a uns dez quilômetros da outra. Os índios saiam caminhando e visitavam seus parentes. Nisso, iam caçando, pegando comida”, lembrou Oliveira. “Isso era costume e isso acabou.”

Segundo ele, não há mais espaço livre para a caça e o extrativismo característicos dos Kaiowás. As reservas para a etnia também são muito pequenas e isso acaba colaborando para os problemas de violência e saúde enfrentados pelos indígenas.

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